Cola na lei rouanet, patuléa!!!

terça-feira, abril 01, 2008

"O teatro não é inviável economicamente"

Celso Frateschi
especial para o jb

O teatro no Brasil celebrou o seu dia internacional (27 de março) unido na insatisfação quanto aos mecanismos de financiamento e dividido quanto às possíveis soluções desses impasses. Entre essas soluções, tramita no Congresso um projeto de lei que cria a Secretaria Nacional de Teatro, para apressar o fluxo dos pedidos de financiamento via renúncia fiscal, que seria ainda mais facilitado por um mecanismo semelhante à Lei do Audiovisual, que permite o abatimento de até 125% sobre o valor financiado.

Seguindo uma máxima de que não devemos propor o novo sem entender o velho, sob o risco de o novo já nascer envelhecido, sugerimos a análise da eficiência e da eficácia dos mecanismos vigentes, uma vez que esta nova proposta se baseia nos mesmos princípios da Lei Rouanet, que todo mundo quer mudar.

O principal objetivo da Lei Rouanet é estimular a economia da cultura, proporcionando aos cidadãos brasileiros maior acesso à cultura produzida em nosso país. No entanto, antes da lei, as temporadas de nossos espetáculos tinham de seis a oito sessões semanais. Hoje são duas a três sessões por semana. Por que percebemos essa radical redução?

Muitos alegam que não há mais público para longas temporadas. Se isso é verdade, como parece, é mais um motivo para questionarmos o mecanismo atual. Ao cabo de quase duas décadas de aplicação da Lei Rouanet, a atividade teatral diminuiu, pelo menos em termos relativos. O número de produções cresceu, mas elas estão cada vez mais concentradas na Região Sudeste. Como explicar o aparente paradoxo?

Cabe registrar que a atividade teatral, segundo dados do IBGE, é desenvolvida em 2.220 municípios brasileiros, quase metade dos municípios do país. No entanto, durante todos os anos de vigência da Lei Rouanet, apenas algumas dezenas deles foram atendidas – 80,3% dos recursos se concentram no Sudeste, principalmente em São Paulo e no Rio de Janeiro.

Quase todos os recursos da Lei Rouanet para o teatro são aplicados na montagem do espetáculo e na manutenção de uma temporada cada vez mais curta. Por quê? Não seria porque o empresário, que visa ao lucro – e é natural que seja assim – foi induzido a produzir cada vez mais montagens, ao perceber que o seu lucro não vem da bilheteria, o que seria desejável numa economia saudável, mas está embutido no processo de produção? Se a razão de ser do espetáculo não é mais o público, que sentido pode existir nesse teatro?

O teatro movimenta um número cada vez maior de recursos da Lei Rouanet: R$ 44.376.571 em 2000 e R$ 107.967.652 em 2007. O preço do ingresso é cada vez mais caro, chegando a custar um salário mínimo, e aí chegamos ao limite de um espetáculo, financiado com dinheiro do cidadão, ter o ingresso mais caro do que o salário de quem o subsidia.

Pode-se alegar que o teatro não se auto-sustenta economicamente e que sempre precisará de subsídios. Um exemplo de que isso nem sempre é verdade é o caso de um proponente que, em cinco anos, captou mais de R$ 40 milhões. As montagens foram sucessos retumbantes e geraram lucros significativos. Não obstante, a companhia sempre requisitava, a cada montagem, mais recursos. O último pedido, negado pelo Conselho Nacional de Incentivo Cultural, chegava a R$ 27 milhões. Isso sugere que o teatro pode dar lucro e que esse lucro pode estar sendo aplicado em outros setores da economia. O teatro, ao menos para alguns, não é inviável economicamente.

Com a Lei Rouanet, os orçamentos públicos para a área de cultura escassearam, com exceção do federal e de raros casos estaduais e municipais. A distorção chega ao ponto de TVs públicas, orquestras sinfônicas, o Sistema S e até a Funarte precisarem usar a Lei Rouanet. Alguns produtores argumentam que os mecanismos vigentes protegem a produção dos humores do orçamento público, mas os valores aprovados para captação crescem ano a ano e os valores captados, que dependem dos orçamentos das empresas, tiveram uma grande queda no ano de 2007.

O teatro não é apenas uma atividade econômica. É uma forma de expressão e de construção de conhecimento, que engrandece o cidadão na sua humanidade e sociabilidade. É uma arte pública e possui na sua própria essência o ato político da cidadania. É um exercício de liberdade que expõe, pela representação, o homem em suas relações, num ato ao mesmo tempo individual e coletivo.

Comemoramos o Dia Internacional do Teatro com velhas angústias e velhas e novas esperanças, mas com ânimo renovado para o debate e para a busca de soluções , que atendam ao teatro não apenas como atividade econômica, mas também na sua dimensão simbólica e como direito do cidadão.

[ 30/03/2008 ] 02:01

fonte:
JB Online (http://jbonline.terra.com.br/editorias/cultura/papel/2008/03/30/cultura20080330009.html)

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