O mecanismo acumula queixas, questionamentos e reclamações quanto a sua eficiência, eficácia e efetividade desde sua promulgação e de suas primeiras ações. No ambiente acadêmico encontramos - não apenas no campo cultural (ou da econômia e políticas da cultura), mas também no das artes (teatro, principalmente), gestão, comunicação, saúde (?), biblioteconomia e ciência da informação, só para citar os que eu conheço, tem muitos outros, pode ter certeza... e se você tiver curiosidade coloca no "google scholar" ou no portal de periódicos da capes - um volume extenso de pesquisas sobre a principal forma de financiamento público da cultura no país. Sabemos que o setor cultural possui um potencial econômico significativamente elevado, potencial de movimentação financeira, geração de empregos (direta e indireta) transferência de capital e fácil associação com outros setores econômicos. Uma programação cultural qualquer, por inzêmprio um show de samba-de-roda, atrai uma determinado quantidade de pessoas (a audiência do tal evento!), portanto, junto com eles vêm aqueles prestadores de serviço que todos conhecemos: o vendedor de cachorro-quente, churrasquinho, uma barraca de capeta (hahaha), uma outra de bebida, vendedor de balão, bicho de pelúcia, vendedor de cerveja etc, etc... estamos cansados de ver isso no carnaval, né? Mas notem que eu me referi a um evento cultural de samba-de-roda, uma manifestação que, supostamente, não é tão grande (resguardem as devidas proporções, por favor!) quanto o sambinha do recôncavo, de caboclo ou da zona rural. Nesse caso específico, trata-se de um evento em um bairro, movimenta-se a economia do bairro. Esquecendo os empregos indiretos (a maioria dos empregos gerados pela cultura, por sinal... sim, e quando eu falo de indiretos eles podem ser formais ou informais...), temos os empregos diretos que compõem a extensa cadeia produtiva da cultura: os técnicos de som e iluminação, eletricistas, produtores, artistas, roadies, assessores de comunicação e imprensa, fotógrafos, operadores de câmera, demais staff members que eu costumo chamar de "pessoas que definitivamente lutam a batalha da cultura: montam e desmontam o palco, carregam os equipamentos de som, os equipamentos de luz (e acreditem, eles não são NEM UM POUCO LEVES!). Isso só para citar um evento pequeno! Então temos uma cadeia pra lá de complexa... como diria Caetano, "o segredo nem eu mesmo sei". Mas porque eu falei tudo isso mesmo? Para ilustrar o segmento da economia cujo principal suporte é lei rouanet (grosso modo, é mecanismo de renúncia fiscal para patrocinadores culturais). A grande queixa se dá sobre a efetiva participação e mediação da lei e do Estado diante das produções e projetos financiados por meio da lei. Outro ponto que sempre polêmico são os critérios adotados pelo ministério para aprovar ou rejeitar um projeto... temos aquelas famosas discussões.... como o "milagre é muito recente", não tenho tempo de organizar as idéia e participar de modo mais consistente da discussão (hoje, pelo menos), coloco os textos que estão no centro das atenções... mas vou me pronunciar depois que eu ler tudo com calma, you don't have to worry about that!
No último dia 27 vimos uma grande manifestação da área teatral, atacando a dita lei. Como conseqüência temos um artigo do queridíssimo Juca Ferreira (o nosso Dalai Lama!!! Sem piadas, tô falando sério!) e de Celso Frateschi publicado com nomes diferentes: o primeiro foi publicado no JB online (já coloquei aqui no blog, inclusive!) e na Folha de São Paulo. Como resposta, ou melhor, como continuação do debate, temos dois artigos publicados na revista eletrônica Cultura e Mercado abaixo.
Discuta, opine, participe, sugira, participe também da ação! Não recrame por recramar, não foi por isso que seus pais te mandaram para os melhores colégios internos da Suíça, conservatórios parisienses e melhores universidades britânicas!
Boa leitura!
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31/03/2008 Julinho da Adelaide Sobrinho
Semana passada vimos publicar o mesmo artigo com duas versões, dois títulos e um só conteúdo. O primeiro, no Jornal do Brasil, retumbava: “O teatro não é inviável economicamente”. Seu autor, Celso Frateschi, presidente da Funarte.
O outro traz a assinatura conjunta deste com o secretário-executivo do Ministério da Cultura, Juca Ferreira, e é publicado na Folha de S.Paulo sob o título “Incentivo ao Teatro?”. O motivo é a comemoração do dia do teatro.
Com as mãos abanando diante do caos vivido pela produção teatral, vieram a público colocar a culpa pelos desmandos à Lei Rouanet, da falta de público à diminuição das temporadas. Só faltaram pedir o pescoço dos governantes, diante do descaso do mecanismo governamental em relação às necessidades das artes cênicas brasileiras.
Quase nos fizeram acreditar que o problema da lei é a própria lei, como se tivesse pernas próprias e não dependesse de governo para seguir o caminho correto, ou desejável. Cinco anos de poder foram necessários para descobrir verdadeiros exus: empresas e produtores culturais que lucram com a lei. A pena para a doença, matar o doente. Em português claro: acabar com a lei.
Mas como pode a Lei Rouanet ter esse poder todo se ela é tão-somente um mecanismo de estímulo ao investimento privado? Convenhamos que qualquer julgo além do seu campo de atuação constitui mera (ir)responsabilidade interpretativa de quem escreve, ou simplesmente assina, o petardo. O que espanta é o próprio poder público incitar uma visão equivocada da lei. Com que objetivo?
Vale lembrar que o teatro, assim como todas as outras artes, está órfão de políticas públicas. O MinC optou, já em 2003, por extinguir as secretarias chamadas finalísticas (música/artes cênicas, patrimônio/museus, livro e leitura), dando prioridade apenas para o audiovisual. No lugar, ampliou o escopo do Ministério e passou a dar prioridade para questões como Tv pública, propriedade intelectual, cultura digital, diversidade cultural. Apostou na transversalidade em detrimento da política setorial.
Amplamente aplaudida e reconhecida no Brasil e no mundo, as políticas propostas por Gilberto Gil carecem ainda de ações programáticas que as sustentem. Sem uma política transversal consistente (e que vá além do discurso) corremos o risco de perder o velho e não ganhar o novo.
Como pode o artigo do MinC vociferar: “não devemos propor o novo sem entender o velho”, se ele próprio não consegue dar conta do maior e mais eficaz sistema de financiamento à cultura que o Brasil já teve?
A Lei Rouanet tem problemas, todos sabemos. Já eram sérios e graves em 2002. Com a inabilidade deste ministério em resolvê-los, a Lei transformou-se numa bomba-relógio, pronta para estourar nas mãos do ministro Gilberto Gil. Como não está disposto a aceitar o fardo, o MinC quer colocar o problema da lei no colo do “mercado”, das empresas que se promovem e lucram com a lei. Como se o MinC não fosse o único órgão responsável por seu destino e gestão.
A Lei Rouanet é acusada de causar distorções no mercado cultural desde aquela campanha presidencial. Artistas carentes foram ao Canecão pedir socorro a Lula, pois a cultura estava sendo privatizada. Desde então o MinC realizou uma série de viagens com todo o seu gabinete para os quatro cantos, prometendo mudanças e ouvindo o que já sabíamos. Três anos depois, decretou mudanças cosméticas, sem efeitos práticos.
O que os fogos de artifício escondem é que a causa de tais distorções não está na lei, mas sim na falta de políticas mais amplas, tanto para as artes quanto para o mercado, que quer e precisa crescer e exige um conjunto de ações mais adequadas ao empreendedorismo e ao lucro (sim, avisa lá que somos capitalistas).
Mas estamos longe de alcançar uma realidade em que o Ministério da Cultura comemore o crescimento e o sucesso econômico de empresas culturais, dando-lhes o suporte necessário para empregar gente, recolher impostos e ajudar a financiar a rica diversidade cultural do Brasil.
Um mecanismo de financiamento privado não pode ter a responsabilidade de compensar a falta do Estado, mais ausente do que nunca. Em termos de financiamento público, a própria Lei já abarca mecanismos de compensação, como o Fundo Nacional de Cultura, que sempre foi acusado de ser uma caixa-preta. Hoje continua na mesma situação, com um volume insuficiente de editais, que continuam sem transparência, geridos e definidos por grupos que sustentam o poder e a ideologia do MinC.
Parece haver um entrave ideológico a ser superado pelo MinC. A Lei foi criada com base num princípio liberal, de que a sociedade (incluindo o mercado) teria condições, por si, de regular a lei. Mas como pode a sociedade saber o que é bom para a sociedade, se existe um grupo de pessoas privilegiadas com esse dom supremo?
Então o Governo faz de tudo para exercer comando sobre os projetos, interferindo diretamente na comissão que os aprova, gerando burocracias para segurar o que não lhe convém e facilitar o que considera alinhado com a “atual política”. E faz de maneira inábil, truculenta. Mostra-se cada vez mais perdido com a situação, chegando a implementar e mudar diretrizes e procedimentos como quem troca de roupa.
O Estado foi incapaz de incorporar a Lei Rouanet como política pública, deixando-o ao prazer do mercado. A primeira reunião que o MinC fez com as empresas patrocinadoras foi em 2007. Ainda assim para cobrar, não para orientar, dar diretrizes, ou declarar uma política clara para o investimento privado. Isso é um contra-senso, já que a aplicabilidade da lei está intimamente ligada à ação das empresas.
Este governo trata a lei como um filho bastardo, fruto das andanças do Estado com o mercado. Não o reconhece como um potente instrumento de financiamento à cultura. E por não o acolher, age contra ele. E por ele é consumido, pois não consegue formular alternativas para o aniquilar, substituir ou complementar.
Por outro lado, a lei foi apropriada pelo mercado. Empresas a utilizam como estratégia de comunicação. Isso não é uma distorção em si, e não é um mal em si. É apenas conseqüência do abandono do mecanismo como ingrediente de política cultural que dialoga com o capitalismo em que está (indesejavelmente) inserido.
Vendo-se incapaz de atuar na lei pela via do diálogo, o MinC passou a criar um arsenal de regras e burocracias, desenvolvidas com o objetivo único de tornar o instrumento moroso e ineficaz. A estratégia é esvaziar a lei, como fez Celso Frateschi em sua gestão municipal em relação à Lei Mendonça. Repete a dose à frente da Funarte, responsável por conceder parecer técnico à Lei.
Como resultado disso, criou-se um mercado paralelo de aprovação de leis dentro do próprio ministério, que atuava (ou atua?) no sentido de quebrar os bloqueios criados por este governo. A ação resultou no final de 2007 na prisão de uma quadrilha pela Polícia Federal. Um tiro no pé.
O mercado agora prepara ofensiva. Vários movimentos estão se formando pelo Brasil afora em defesa dos direitos culturais e liberdade de expressão, consagrados por nossa Carta Magna e pela própria Lei 8.313/91.
Aplacados pela censura e pela perseguição, os autores deste artigos protegem-se sob o codinome Julinho da Adelaida Sobrinho, um parente fictício de Julinho da Adelaide, heterônimo de Chico Buarque de Holanda, criado para fugir da censura dos tempos difíceis da ditadura, que insiste em nos rodear.
fonte: Cultura e Mercado
Incentivo ao debate
31/03/2008 Carlos Minuano
Principal mecanismo de financiamento à cultura no país, a Lei Rouanet, que já acumula desde sua promulgação em 1991, um extenso histórico de polêmicas e debates, volta ao centro de nova discussão – e o estopim desta vez veio do próprio Ministério da Cultura (MinC). Em um controverso artigo "Incentivo ao Teatro" publicado no jornal Folha de S. Paulo, o secretário-executivo do MinC, Juca Ferreira, e o presidente da Funarte, Celso Frateschi, questionam a eficiência da lei e destacam distorções em seu uso.
O texto aponta uma suposta redução da atividade teatral e em paralelo o crescimento nos lucros dos produtores, após quase vinte anos da lei. Outra crítica ataca ainda a suposta concentração das produções na região sudeste. A classe teatral e artística não demorou a reagir contra o artigo, também publicado pelo Jornal do Brasil – curiosamente assinado apenas por Frateschi.
Ao afirmar que o problema está na ganância dos produtores, o artigo coloca no mesmo nível produções milionárias e alternativas, observa Paulo Pélico, diretor-secretário da Apetesp (Associação dos Produtores Teatrais do Estado de S. Paulo). "A crise a que se referem é muito anterior à lei, vem desde a década de 80". Para Pélico, os motivos são vários, mas destaca a falência da educação no país. "Falta repertório para entender Shakespeare, Nelson Rodrigues, e tantos outros".
O fato é que já se tornou praxe atacar a Lei Roaunet, seja por parte do governo ou do mercado. Entretanto, apesar dos golpes chegarem dos dois lados, ambos continuam a se valer dela. Durante a campanha de Lula à presidência, em 2002, a lei foi acusada de provocar deficiências no mercado cultural. Apesar das viagens pelo país, dos debates e das promessas reafirmadas por seis anos, as esperadas mudanças no incentivo não aconteceram – com exceção de um decreto em 2006, que não avançou em questões fundamentais.
Pélico defende uma reformulação efetiva que recupere, sobretudo, as três dimensões da lei: o mecenato, para parcerias público-privadas, o Fundo Nacional de Cultural (FNC) para os projetos sem visibilidade comercial e o Fundo de Incentivo Cultural à Arte (Ficarte) para as grandes produções. "Quem sabe acabamos com discrepâncias como o Cirque du Soleil disputando recursos com os grupos independentes da praça Roosevelt".
No momento três projetos de lei sobre o tema encontram-se em trâmite, o PL que cria a Lei Geral do Teatro que pretende estender fomento municipal paulista em âmbito federal; o da Secretaria de Teatro, para criação de agência nacional do setor, equivalente a Ancine – que deve seguir para o senado ainda nesta semana e, por último, o PL da Lei Geral das Artes, de autoria do próprio Frateschi, suposta alternativa à Lei Rouanet.
Gestão problemática
Em 2006, a Policia Federal prendeu um grupo que cobrava propina no MinC para acelerar trâmite de projetos que pleiteavam incentivo da Lei Rouanet. Os problemas, no entanto, não cessaram com a prisão dos acusados. Pélico reclama que o funcionamento, tanto do MinC quanto da Funarte, permanece caótico. "Sei de casos em que projetos desapareceram seguidas vezes, incluindo cópia e cópia da cópia", conta. "É o ambiente perfeito para a corrupção".
Apesar do cinema ter permanecido às margens da polêmica – aliás, outro aspecto criticado no episódio – na opinião do diretor José Joffily ("Quem Matou Pixote?", "Dois Perdidos Numa Noite Suja") o problema não está no incentivo, mas na falta de uma legislação que consiga inibir o lobby dominante do setor. Segundo ele, se o estado tivesse força de legislar sobre emissoras concessionárias não haveria espaço para essas distorções apontadas pelo governo e por produtores.
"Não precisaríamos ser socorridos pelo estado por meio de incentivos se os canais de televisão tivessem que terceirizar conteúdo e produções, pois a demanda seria bem maior". O problema da distribuição dos produtos audiovisuais poderia ser também atendido por parceria com as emissoras, ressalta Joffily
fonte: Cultura e Mercado
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